Para o meu irmão Pedro, que me ensinou o termo "Falar Pequenino"
Após algum afastamento, cá vem a actualização. E nada melhor como a avaliação de uma boa "conversa de autocarro" para o fazer.
Final de exames do primeiro semestre. Entro eu no 23 e eis que a viagem começa logo bem, estando eu a picar o passe e a ouvir desde logo uma simpática senhora dizer para as amigas: "trússe um laranjinha pa "x", e trússe um castanhinho po "y", e trússe um azulinho pa "z"" e por aí adiante, merecendo uma contorcidela interior da minha parte, de cada vez que a senhora dizia "trússe". Pois que calhou eu sentar-me mesmo atrás das ditas senhoras, o que valeu um resto de viagem bastante interessante, cuja conversa se resume a isto (muito, porque entretanto muitos pormenores foram desaparecendo da minha cabeça; as reticências são pormenores que não interessavam e saltos na conversa):
"Vim d'ir a buscar o menino, chiguei a casa e ele enterteve-se lá cum brinquedinho... Fiz uma sopinha de feijãozinho com chouricinho, que a minha filha já me tinha dito "oh mãe, tenho tantas saudades da tua sopinha"... e ponho umas couvinhas, e uns broculozinhos..."
E por aí adiante, com muito mais barbaridades e palavras "fofinhas" pelo meio, que não me lembro.
A esta altura, já eu me roía de dores nos ouvidos e pontadas no coração com tanta calinada à nossa bela língua, para não falar das palavrinhas queridinhas e fofinhas, todas acabadinhas em -inha ou -inho, que são sempre tão agradáveis de ouvir!
É como entrar numa loja e estar a ser ajudado por uma senhora da loja que nos diz: "ah, leva esta camisolinha? E um casaquinho?... Costumamos vender estes coletezinhos muito bem... Um cachecolzinho? Os gorrinhos são tão engraçados, experimente um bonézinho... São xx eurinhos"
É que dá volta ao estômago só de ouvir.
Porque será que as pessoas julgam que são mais simpáticas ou fofas se falarem "pequenino", se disserem -inho e -inha no fim de cada palavrinha?
Enfim, é sempre motivo de orgulho saber que temos tanta gente a honrar a língua portuguesa com um belo discurso. Mas eu não culpo as pessoas, aliás, é impossível culpar pessoas cuja educação se vê que não cruzou o ensino superior, quando se vêem senhores professores, doutorados e afins, jornalistas e uma série de outras figuras que nos entram todos os dias pela televisão dentro, ou cujos slides vemos todos os dias (nas aulas), que dizem "prontos", "pograma" e outros, e que dão erros ortográficos atrás de erros, desde "expecial", aos acentos do "a" mal aplicados, passando por hífens mal colocados dentro das palavras, e outros tantos do género.
E depois o factor "parecer fofinho" que leva a maioria das lojistas a vender "casaquinhos, chapeuzinhos, camisolinhas, blusinhas..." e por aí!
Sou esquisitinha, eu sei, mas faz-me realmente impressão o "falar mal". E o "pequenino".
Pontadas no coração e palpitações! Tenho dito!